Em 30 anos de São Paulo Fashion Week, vimos muitas vezes as celebridades desfilando. Mas o fenômeno recente dos influenciadores nas passarelas rendeu muitos debates sobre a essência da profissão de modelo. Conversamos com modelos, agentes, estilistas e jornalistas para entender quais as vantagens e as desvantagens sobre ter convidados famosos que não são profissionais de moda no casting.
Anderson Baumgartner, Way Model
“Uma influenciadora pode fazer um desfile no São Paulo Fashion Week, mas ela tem que se profissionalizar: saber andar numa passarela, segurar uma roupa e desfilar como modelo, com todas as condições, desde prova de roupa, backstage, maquiagem e tudo mais. Levar só influenciadores para a passarela seria a mesma coisa que uma modelo subir num palco de um teatro, onde é sagrado para um ator, sem se profissionalizar para aquilo.”
Alessandra Berriel, modelo
“Eu não tenho problema algum com influenciadores, desde que eles não atrapalhem o meu trabalho. Eu não sei fazer o que ela faz, mas quando ela vem para o meu lugar, ela tem que aprender o que é ser modelo. Quando ela não respeita, ela não entra na luz, atrapalhar a modelo que está atrás dela se andar muito devagar ou rápido, atrapalha o styling, o diretor, o DJ, os fotógrafos… Quando a gente ia fazer uma participação numa novela, a gente estudava as atrizes, porque é um sinal de respeito.”
Carol Ribeiro, modelo e dona da Prime Management
“O problema é colocar o casting inteiro de influenciadores ou de atores numa passarela. É como se você fosse fazer um filme só com modelos. Eu acho que dá para fazer essa troca, mas não você colocar 100% do casting de influenciadores. Se o estilista quer colocar algo diferente na criação dele, tudo bem, mas as modelos têm o seu espaço e sua importância!”
Liliana Gomes, Joy Mgmt
“A gente trabalhou muito nos anos 90 com celebridades. E celebridades era o nome que a gente dava para todas as pessoas que eram artistas famosos, pessoas famosas que vinham na moda, faziam alguma coisa e saíam. A mudança importante que a gente teve é que hoje a gente trabalha com personalidades, que têm algo a dizer. Representaos a Erika Hilton, que é uma deputada, uma mulher trans, que quer existir na moda também. Então todos esses aspectos fazem com que hoje a moda tenha mais significado. Estamos construindo um lugar que a moda saia desse lugar de superficialidade para dizer alguma coisa.”
Eli Hadid, Mega Model
“Tem modelos que também são influenciadoras e cada vez mais as modelos vão virar influenciadoras. Mas a modelo é modelo. Você não vai ver um influenciador entrando no campo e jogando futebol. Você precisa ter um talento, essa é uma profissão e não um bico. Influenciador tem que ficar na arquibancada durante o jogo de futebol e na plateia durante um show, ele não sobre no palco por ser influenciador. A passarela é um lugar que deve ser ocupado por profissionais e podem modelos que são influenciadoras. “
Laís Ribeiro, modelo
“Eu acho que influenciador tem que ficar sentado. assistindo um desfile, que é o lugar dele, e modelo na passarela. Às vezes tem essa confusão quem tem mais seguidores e isso está acabando com as pessoas que tem talento mas tem poucos seguidores. Tem muita gente talentosa, principalmente aqui no Brasil, tanto modelo quanto designers e equipe de bacsktage.”
Adriana Bozon, diretora-criativa da Ellus
“A gente tem chamado influenciadores mais para divulgar o desfile para participar como um convidado, mais do que para desfilar. Cada marca tem que pensar como fica melhor e o que tem a ver aquele influenciador, por que ter ele e o que ele traz para a sua marca.”
Alexandre Herchcovitch, estilista
“Os meus primeiros desfiles que aconteceram no começo dos anos 90 praticamente eram só com amigos e clientes, porque eu não tinha acesso a modelos profissionais. Com o passar do tempo e com a possibilidade de eu contratar modelos profissionais, e isso veio junto com os desfiles no São Paulo Fashion Week, eu também quis testar a minha roupa nelas. Em casting, eu olho muito a personalidade da pessoa. Se eu quero um dia convidar uma celebridade para a passarela, porque tem a ver com a coleção, eu faço. Quem entra na passarela para desfilar uma roupa minha precisa ser um profissional que vai mostrar a minha criação de uma maneira que o público que esteja assistindo entenda melhor.”
Pitty Talliani, estilista da Amapô
“Você tem milhões de armas na sua mão. Se colocar um influencer vai te dar uma visibilidade, e você precisa disso, você pode ter. E quem sou eu para julgar? Ao mesmo tempo, ele pega o lugar de um profissional de moda. Isso não é legal… Mas são muitas camadas, é algo delicado. Tem estilista que não é estilista, que faz desfile!”
Mônica Sampaio, estilista da Santa Resistência
“A gente vê um lado da mídia que a marca precisa, porque os influenciadores atraem isso. E tem o outro lado dos modelos que batalharam muito, que chegam de manhã às vezes somente com um café da manhã e ficam ali lutando, vêm de outro estado para lutar, então é uma concorrência desleal. Quem está com o poder deveria simplesmente encarar aquilo de uma forma mais equalitária. Não tirar o lugar, mas virar um modelo também.”
Gloria Kalil, jornalista
“As pessoas hoje têm uma informação muito variada de moda, e chegada dos influenciadores é uma camada a mais de informação para os consumidores. Vão continuar tendo jornalistas, vão ter que continuar tendo pessoas ligadas à história da moda, estudantes de moda e tudo, que vão dar uma coisa um pouco mais aprofundada. Já os influenciadores falam de consumo. Uma vez vi uma jornalista ficando irritada e ela falou para a influenciadora: “Você não sabe nada. Você sabe quem foi o Saint Laurent?”. Ela respondeu: “Não sei, nem quero saber, eu só quero a bolsa.”